quinta-feira, setembro 25, 2008

Tomá lá e embrulha...

O tão badalado post do exmo. sr. jornalista Eugénio Queiroz teve as primeiras reacções vindas de entidades oficiais. A minha vénia ao jornalista do Record, que teve a coragem de as publicar no seu blog. Para além de uma carta do presidente do Conselho Deontológico do Sindicato dos Jornalistas, Humberto Santos, presidente da Associação Portuguesa de Deficientes, enviou o seguinte e-mail ao autor do post "Para quê?":

"A Associação Portuguesa de Deficientes foi alertada por diversos associados e outras pessoas que, não tendo qualquer tipo de deficiência, se sentiram incomodadas com o conteúdo do artigo de opinião subscrito por V. Exa., colocado no seu blog, em 9 de Setembro, a propósito dos Jogos Paralímpicos. O que ressalta em primeiro lugar deste artigo é o facto de o Senhor reduzir os Jogos Olímpicos e os Jogos Paralímpicos “à caça à medalha”, menorizando, assim, todo o esforço e empenho dos atletas que neles participam. Mas enfim, trata-se da sua opinião e dela não vem mal ao mundo. O que a Associação Portuguesa de Deficientes não pode deixar de notar é o facto de este artigo deixar transparecer laivos de uma mentalidade retrógrada, mesquinha e discriminatória, mentalidade essa que condicionou, e ainda condiciona, a vida das pessoas com deficiência e lhes nega o usufruto dos mais elementares direitos humanos. De facto, o Senhor defende, da mesma forma paternalista que acusa os outros de proceder, que os atletas com deficiência possam praticar desporto, nas modalidades que classifica de uma “espécie de ATL”, mas acha que a prestação destes atletas não deve ser objecto de notícia, porque, em sua opinião, apenas serve “de motivação” para “estes pobres coitadinhos” (aqui aspas são nossas). Segundo o que se pode depreender das suas palavras, a filosofia dos Jogos Olímpicos – mais alto, mais forte, mais rápido – não se aplica a estes atletas. O Senhor acha que, no caso dos atletas com deficiência, o prazer de correr ou jogar, aliado à vontade de se exceder, ir mais além, tudo isto conjugado com o espírito de sacrifício, não é desporto é ATL. Acha que a prestação destes atletas não carece de ser valorizada pelos outros, deveria ficar intramuros, numa espécie de gueto, em que as pessoas se sentiriam recompensadas por os deixarem participar no que classifica como uma “espécie de ATL”. A história está repleta de ensinamentos sobre o enorme sofrimento que este tipo de preconceitos causou à humanidade e que no seu limite levou ao extermínio de milhares de pessoas com deficiência, além de milhões de outras pessoas que também eram “diferentes”. “Desenvolver as habilidades e a condição física específicas das modalidades, apreciar e ser capaz de participar em competições, participar a um nível apropriado à sua habilidade e experiência”, são os princípios transmitidos na Faculdade de Motricidade Humana sobre desporto. Nesta Faculdade, onde são formados os técnicos de desporto, incluindo os que vão treinar pessoas com deficiência, estes princípios valem para todo o tipo de desporto, independentemente de quem o pratica. Felizmente a sociedade evolui, os seus membros vão aprendendo com os erros e incorporando novas formas de olhar o seu semelhante. De igual para igual. Por isso existe uma Declaração Universal dos Direitos do Homem, uma Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres, uma Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial e, mais recentemente, uma Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Claro que nem todos acompanham esta evolução. Há sempre quem resista à mudança. Por medo ou ignorância. Felizmente é uma minoria que mais cedo ou mais tarde deixa de ter qualquer expressão. Não podemos deixar de louvar a cobertura dos Jogos Paralímpicos feita pela Comunicação Social. Sem preconceitos nem paternalismos. Não só foi positivo o facto de reconhecerem o valor destes atletas, como ajudou a desmistificar muitas ideias preconcebidas sobre as capacidades das pessoas com deficiência. Foi significativo o número de cidadãos que acompanhou os Jogos e vibrou com a prestação dos atletas paralímpicos. No futuro os Jogos Paralímpicos, como outras provas de desporto praticado por pessoas com deficiência, serão vistos como mais uma iniciativa no panorama do desporto nacional e internacional. Deixamos ao critério de V. Exa. tornar ou não pública esta nossa posição.
Com os melhores cumprimentos
O Secretariado Executivo daDirecção Nacional"


É certo que a liberdade de expressão é um direito de todos nós, mas há que saber lidar com certos e determinados assuntos.

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